segunda-feira, 31 de janeiro de 2011

Paulo Teixeira e a Polêmica na Cultura

Da Carta Maior

“Creative Commons está dentro de uma política de governo”

Em entrevista à Carta Maior, o deputado Paulo Teixeira (SP), novo líder do PT na Câmara Federal, avalia o episódio da retirada da licença Creative Commons do site do Ministério da Cultura. Crítico da decisão, Teixeira afirma que a licença "está dentro de uma política de governo, de democratização do acesso ao conhecimento e à cultura" e que "sua retirada contrasta com decisões anteriores que vêm do governo Lula". O parlamentar considera que a medida vai gerar um debate dentro do governo, mas não acredita em retrocesso na área.
A decisão da ministra da Cultura, Ana de Holanda, de retirar a licença Creative Commons do site do Ministério da Cultura, provocou protestos e abriu um intenso e enérgico debate entre integrantes do governo, do movimento de software livre e defensores de recursos educacionais e culturais abertos. Afinal de contas, a decisão da ministra representa ou não uma mudança na orientação do governo federal sobre o tema?

Na avaliação do deputado federal Paulo Teixeira, novo líder da bancada do PT na Câmara dos Deputados, a “licença Creative Commons está dentro de uma política de governo, de democratização do acesso ao conhecimento e à cultura”. Teixeira defende que a lei de direitos autorais, assim como a lei de patentes de medicamentos devem ser subordinadas ao interesse social.

O parlamentar não acredita em retrocesso nesta área: “A posição do Ministério da Cultura vai abrir um debate no governo sobre a política nesta matéria. Não haverá retrocesso na minha opinião. Sugiro que a ministra Ana de Holanda coloque a minuta de lei que está na Casa Civil novamente em consulta pública”.

Carta Maior: Qual sua avaliação sobre a decisão da ministra da Cultura de retirar do site do Ministério da Cultura as licenças Creative Commons?

Paulo Teixeira: A licença Creative Commons está dentro de uma política de governo, de democratização do acesso ao conhecimento e à cultura. Tem respaldo na política externa praticada pelo Itamaraty, crítica da lei de direitos autorais aprovada pelo país. Ela é usada em vários órgãos da administração federal. A sua retirada contrasta com decisões anteriores que vêm do governo Lula.

Carta Maior: Há alguma mudança de concepção no governo federal sobre as questões de compartilhamento digital e software livre?

Paulo Teixeira: A Presidenta Dilma Roussef, então ministra da Casa Civil, foi à Campus Party em janeiro de 2010 e se encontrou com Lawrence Lessig, grande formulador das licenças Creative Commons. Naquele momento ela fez um pronunciamento em oposição à Lei Azeredo, de apoio ao software livre, de apoio a uma política de acesso a internet banda larga para todos brasileiros e de mudanças na lei de direito autoral.

Na minha opinião, a lei de direitos autorais, assim como a lei de patentes de medicamentos estão subordinadas ao interesse social. Ela não pode criminalizar o aluno pobre que precisa tirar xerox de livros e textos para uso estritamente pessoal. Nem tirar cópia de obras esgotadas. Isso limita o acesso ao conhecimento. A lei de direitos autorais no Brasil é uma das mais cerceadoras do mundo.

As gerações que estão no poder no Brasil estudaram comprando livros e também tirando xerox de textos. Em relação ao acesso à cultura, perguntava Fernando Anitelli,do Teatro Mágico "quem no passado não ganhou uma fita cassete de músicas do Chico, Gil, Caetano num lado e noutro lado, uma seleção de rock en roll?"

Mudar a lei de direitos autorais pode promover um melhor resultado no investimento de recursos públicos na promoção de obras culturais e educacionais em formato aberto. O MEC e o Minc podem contratar autores para produzirem obras didáticas e colocá-las à disposição de todos os professores brasileiros e da população em geral. Esse modelo é o chamado Recurso Educacional Aberto-REA e é muito utilizado pelos governos americano e europeus. Isso não quer dizer que as editoras deixarão de vender seus livros. As obras estarão disponíveis também na internet.

Atualmente,todo o investimento público é direcionado à produção de obras protegidas por modelos rígidos de direitos autorais. É o Estado atirando no próprio pé.

Sobre o ECAD, trata-se no meu modo de ver de instituição pública não estatal. Precisa haver, caso não haja, controle do Ministério Público, no mesmo modelo das Fundações e transparência na gestão dos seus recursos. O ECAD não pode ser concebido como órgão privado, como é hoje. Há um interesse difuso, tanto de quem consome os bens culturais, como de quem os produzem, de saber a destinação dos recursos. Ele interfere na produção e na distribuição de bens culturais no país.

Carta Maior: A decisão da ministra provocou muitos protestos de partidários do Software Livre e do Creative Commons que temem um retrocesso nesta área. Na sua opinião, há um risco de retrocesso?

Paulo Teixeira: A posição do Ministério da Cultura vai abrir um debate no governo sobre a política nesta matéria. Creio que todos os atores devem participar do debate para se produzir um consenso. Não haverá retrocesso na minha opinião. Sugiro que a Ministra Ana de Holanda coloque a minuta de lei que está na Casa Civil novamente em consulta pública.

Carta Maior: Como estão os debates no Congresso em torno dos projetos relacionados à regulamentação na internet?

Paulo Teixeira: Até agora conseguimos paralisar o PL Azeredo. Espero que o governo envie o Marco Civil da Internet rapidamente para o Congresso Nacional e, a partir dele, possamos fazer este debate.

sábado, 29 de janeiro de 2011

Ainda a Polêmica do MinC

Artigo de Sérgio Amadeu, um dos mais combativos defensores do software livre....

O movimento de software livre, de recursos educacionais abertos e os defensores da liberdade e diversidade cultural votaram em Dilma pelos compromissos que ela afirmou em defesa do bem comum. No mesmo dia que a Ministra Ana de Holanda atacou o Creative Commons retirando a licença do site, a Ministra do Planejamento Miriam Belquior publicou a normativa que consolida o software livre como a essência do software público que deve ser usada pelo governo.
 
É indiscutível o descompasso que a Ministra da Cultura tem em relação à política de compartilhamento do governo Dilma.
 
Os defensores da indústria de intermediação e advogados do ECAD lançam um ataque a política de compartilhamento de conhecimento e bens culturais lançada pelo presidente Lula. Na sua jornada contra a criatividade e em defesa dos velhos esquemas de controle da cultura, chegam aos absurdos da desinformação ou da mentira.

Primeiro é preciso esclarecer que as licenças Creative Commons surgiram a partir do exemplo bem sucedido do movimento do software livre e das licenças GPL (General Public Licence). O software livre também inspirou uma das maiores obras intelectuais do século XXI, a enciclopédia livre chamada Wikipedia. Lamentavelmente, os lobistas do ECAD chegam a dizer que a Microsoft apóia o software livre e o movimento de compartilhamento do conhecimento.
 
Segundo, o argumento do ECAD de que defender o Cretaive Commons é defender grandes corporações internacionais é completamente falso. As grandes corporações de intermediação da cultura se organizam e apóiam a INTERNATIONAL INTELLECTUAL PROPERTY ALLIANCE® (IIPA, Associação internacional de Propriedade Internacional) e que é um grande combatente do software livre e do Creative Commons. O Relatório da IIPA de fevereiro de 2010 ataca o Brasil, a Malásia e outros países que usam licenças mais flexíveis e propõem que o governo norte-americano promova retaliações a estes países.
 
Terceiro, a turma do ECAD desconsidera a política histórica da diplomacia brasileira de luta pela flexibilização dos acordos de propriedade intelectual que visam simplesmente bloquear o caminho do desenvolvimento de países como o Brasil. Os argumentos contra as licenças Creative Commons são tão rídiculos como afirmar que a Internet e a Wikipedia é uma conspiração contra as enciclopédias proprietárias, como a Encarta da Microsoft ou a Enciclopédia Britânica.
 
Quarto, o texto do maestro Marco Venicio Andrade é falso até quando parabeniza a presidente Dilma por ter “restabelecido a soberania de nossa gestão cultural, anulando as medidas subservientes tomadas pelos que, embora parecendo modernos e libertários, só queriam mesmo é dobrar a espinha aos interesses das grandes corporações que buscam monopolizar a cultura”. O blog do Planalto lançado pelo presidente Lula e mantido pela presidente Dilma continua com as licenças Creative Commons. Desse modo, os ataques que o defensor do ECAD fez a política dos commons lançada por Gilberto Gil, no MINC, também valem para a Presidência da República.

Quinto, o movimento de software livre, de recursos educacionais abertos e os defensores da liberdade e diversidade cultural votaram em Dilma pelos compromissos que ela afirmou em defesa do bem comum. No mesmo dia que a Ministra Ana de Holanda atacou o Creative Commons retirando a licença do site, a Ministra do Planejamento Miriam Belquior publicou a normativa que consolida o software livre como a essência do software público que deve ser usada pelo governo. É indiscutível o descompasso que a Ministra da Cultura tem em relação à política de compartilhamento do governo Dilma.

(*) Sergio Amadeu da Silveira é professor da UFABC. Sociólogo e doutor em Ciência Política. Foi presidente do Instituto Nacional de Tecnologia da Informação e primeiro coordenador do Comitê Técnico de Implementação do Software Livre na gestão do presidente Lula.

domingo, 23 de janeiro de 2011

As Polêmicas da Cultura

Publiquei aqui recentemente um debate sobre novas posições assumidas pelo Ministério da Cultura, que já despertam favoráveis e contrários a respeito. A partir de um alerta de meu amigo Marcos Pardim, encontrei hoje uma nova publicação a respeito, que mostra um pouco mais a fundo a posição do MinC, apesar da posição aparentemente contrária no espírito da nota. Como a notícia vem de O GLOBO, todo cuidado é pouco. Vejamos:

Do Luis Nassif


Por foo


MinC abre polêmica após retirada da licença Creative Commons do site do ministério

RIO - Anunciada quinta-feira, gerou chiadeira nas redes sociais a decisão do Ministério da Cultura (MinC) de retirar de seu site a licença Creative Commons, que dá mais opção de escolha aos autores sobre o uso de sua obras. Na sexta-feira, por exemplo, muitas mensagens no Twitter questionaram a ministra Ana de Hollanda a respeito do assunto. O MinC apressou-se a explicar, em nota, que a alteração no site não está relacionada a mudanças de mentalidade do governo:
"A retirada da referência ao Creative Commons da página principal do Ministério da Cultura se deu porque a legislação brasileira permite a liberação de conteúdo. Não há necessidade de o ministério dar destaque a uma iniciativa específica. Isso não impede que o Creative Commons ou outras formas de licenciamento sejam utilizados pelos interessados".
Quem reforçou o coro de descontentes foi o vice-coordenador do Centro de Tecnologia e Sociedade (CTS) da FGV, Carlos Affonso. Segundo ele, retirar a menção à licença e simplesmente dizer que o conteúdo do site pode ser copiado, desde que o crédito seja dado, cria um problema jurídico pela falta de transparência.
Nos últimos oito anos, o país vem servindo de exemplo para a comunidade internacional com suas iniciativas culturais no âmbito da internet, e essa atitude retroage, sendo um tanto preocupante
- Uma licença Creative Commons é um contrato como qualquer outro e diz exatamente o que o internauta deve fazer para utilizar o conteúdo pretendido - diz Carlos. - Longe de tirar direitos do autor, procura ampliá-los e dar a ele o direito de escolha sobre o que quer ou não compartilhar. A atitude da ministra denota má compreensão da natureza das licenças.
Ele também alerta que a decisão do ministério pode afetar a imagem do Brasil lá fora:
- Nos últimos oito anos, o país vem servindo de exemplo para a comunidade internacional com suas iniciativas culturais no âmbito da internet, e essa atitude retroage, sendo um tanto preocupante.
O Brasil foi o terceiro país a adotar o Creative Commons no mundo, depois de Finlândia e Japão. Hoje, no mundo, há aproximadamente 350 milhões de licenças desse tipo.
A decisão do ministério despertou mais dúvida em relação à forma com que a ministra Ana de Hollanda vai tratar os direitos autorais no Brasil. Isso porque, em sua primeira entrevista coletiva, poucos dias após ser confirmada no cargo, em dezembro, Ana afirmou que o projeto da nova Lei do Direito Autoral, que vinha sendo preparado pela gestão de seu antecessor, Juca Ferreira, poderia ser revisto. Uma das bases do projeto, que ainda não foi enviado ao Congresso, era justamente a maior flexibilização dos direitos do autor.
Ana disse, ainda, que considerava importante o papel do Escritório Central de Arrecadação e Distribuição (Ecad) como representante de um setor da sociedade, e deixou claro que era contrária ao controle da entidade, diferentemente do que propõe o projeto de lei.
Ana Paula Santana, secretária do Audiovisual, disse que a discussão sobre direitos autorais exige paciência:
- Não vai ser a retirada de um selo que vai definir se o MinC vai atuar ou não acerca da questão dos direitos autorais pela internet e do compartilhamento da criação artística. Aliás, a ministra tem afirmado e reafirmado que é a favor da cultura digital. A criação da ideia de economia criativa já é uma afirmação dessa cultura digital como o pilar de uma nova política. O problema é que a discussão sobre os direitos autorais não é tão simples quanto parece e exige cautela, paciência e, especialmente, responsabilidade, uma vez que qualquer ação pode ferir a criatividade de um artista. Essa discussão é uma prioridade para o ministério e para a secretaria.
http://oglobo.globo.com/cultura/mat/2011/01/22/minc-abre-polemica-apos-retirada-da-licenca-creative-commons-do-site-do-ministerio-923586565.asp

sexta-feira, 21 de janeiro de 2011

Mudanças Estruturais na Cultura?

Um debate que surge a partir de alguns movimentos da nova ministra da Cultura, Ana de Holanda. No centro do debate aqueles que já crucificam a ministra, outros que defendem interesses corporativos e outros que acham exageradas e prematuras as posições. Por outro lado, a equipe formada pela ministra também pode nos dar algumas pistas de como isso tudo se comportará. Vejamos a partir de informações do Portal do Luis Nassif, aqui e aqui.

Do Blog do Rovai

Ministra da Cultura dá sinais de guerra ao livre conhecimento
21 de janeiro de 2011 às 13:23

A ministra da Cultura Ana de Holanda lançou uma ofensiva contra a liberdade do conhecimento. Na quarta-feira pediu a retirada da licença Creative Commons do site do Ministério da Cultura, que na gestão de Gilberto Gil foi pioneiro em sua adoção no Brasil.

O exemplo do MinC foi àquela época fundamental para que outros sites governamentais seguissem a mesma diretriz e também publicassem seus conteúdos sob essa licença, como o da Agência Brasil e o Blog do Planalto.

A decisão da ministra é pavorosa porque, entre outras coisas, rasga um compromisso de campanha da candidata Dilma Roussef. O site de sua campanha foi publicado em Creative Commons o que denotava compromisso com esse formato.

Além desse ato simbólico, que demonstra falta de compromisso com o livre conhecimento, a ministra pediu o retorno ao Ministério da Cultura do Projeto de Lei de Revisão dos Direitos Autorais, que depois de passar por um debate de sete anos e uma consulta pública democrática no governo Lula, estava na Casa Civil para apreciação final e encaminhamento ao Congresso Nacional.

O que se comenta é que a intenção da ministra é revisar o projeto a partir das observações do ECAD, um órgão cartorial e que cumpre um papel danoso para a difusão da cultura no Brasil.

Para quem não conhece, o ECAD é aquele órgão que entre outras coisas contrata gente para fiscalizar bares e impedir, por exemplo, que um músico toque a música do outro. É uma excrescência da nossa sociedade cartorial.

Este blog também apurou que Ana de Holanda pretende nomear para a Diretoria de Direitos Intelectuais da Secretaria de Políticas Culturais o advogado Hildebrando Pontes, que mantém um escritório de Propriedade Intelectual em Belo Horizonte e que é aliado das entidades arrecadadoras.

Como símbolo de todo esse movimento foi publicado ontem no site do Ministério da Cultura, na página de Direitos Autorais, um texto intitulado "Direitos Autorais e Direitos Intelectuais", que esclarece a "nova visão" do ministério sobre o tema. Vale a leitura do texto na íntegra , mas segue um trecho que já esclarece o novo ponto de vista:

"Os Direitos Autorais estão sempre presentes no cotidiano de cada um de nós, pois eles regem as relações de criação, produção, distribuição, consumo e fruição dos bens culturais. Entramos em contato com obras protegidas pelos Direitos Autorais quando lemos jornais, revistas ou um livro, quando assistimos a filmes, ou simplesmente quando acessamos a internet."

Essa ofensiva de Ana de Holanda tem várias inconsistências e enseja algumas perguntas:

A principal, o governo como um todo está a par desse movimento e concorda com ele?

Afinal a presidenta Dilma Roussef se comprometeu, como Ministra da Casa Civil e candidata à presidente da República, a manter o processo de revisão dos direitos autorais e promover a liberdade do conhecimento. E um desses compromissos foi firmado na Campus Party do ano passado, em encontro com o criador das licenças Creative Commons, Lawrence Lessig.

O atual ministro da Ciência e Tecnologia, Aloizio Mercadante, quando candidato ao governo de São Paulo, também se comprometeu com esta luta, inclusive numa reunião que contou com a presença deste blogueiro, na Vila Madalena, em São Paulo.

O que a atual presidenta e o ministro Mercadante pensam desta inflexão?

E o pessoal do PT ligado à Cultura, o que pensa disso?

Muitos dos militantes petistas da área comemoraram a indicação de Ana de Holanda.

Alguns entraram em contato com este blog para dizer que os compromissos anteriores não seriam rasgados.

E agora, o que eles pensam dessas decisões da ministra?

Dilma Roussef foi eleita também para dar continuidade ao governo Lula. Se havia interesse em revisar certas diretrizes na área da Cultura e que vinham sendo implementadas com enorme sucesso e repercussão nacional e internacional, isso deveria ter ficado claro. Isso deveria ter sido dito nos diversos encontros que a candidata e gente do seu partido tiveram com esses setores.

Essas primeiras ações do MinC não são nada alentadoras. Demonstram um sinal trocado na política do ministério exatamente no que de melhor ele construiu nos anos de governo Lula.

Não há como definir de outra forma essa mudança rota: é traição com o movimento pela democratização da cultura e da comunicação.

A ministra precisa refletir antes de declarar guerra a esse movimento social.

E o PT precisa assumir uma posição antes que seja tarde.

Porque na hora H, não é com o povo do ECAD e com o da indústria cultural que ele conta.

PS: Conversei com um amigo que entende de conteúdos licenciados em Creative Commons e ele me disse que a decisão da ministra de mudar o licenciamento do site vale exatamente nada no que diz respeito ao que foi produzido na gestão anterior.

Aquele conteúdo foi ofertado em Creative Commons e o Ministério não pode simplesmente revogar a licença de uso.

Se isso for feito, o Ministério infringe a licença Creative Commons e se torna um infrator de direitos.


Do Moacir, participante do portal do Nassif, temos o que segue:


Nassif e amigos:

Uma opinião divergente sobre o Creative Commons dada pelo maestro Marcos Vinícius, presidente da Associação dos Músicos e Regentes (AMAR-SOMBRAS), feita pelo Jornal A Tarde e republicada pelo Jornal Hora do Povo em Março deste ano. Será que a Ministra está tão errada assim em nao querer ceder os direitos autorais para a indústria cultural de graça?


O jornal A TARDE, edição de 06 de fevereiro de 2010, noticiou que a Prefeitura de Salvador, capital baiana que transpira música, não paga ao ECAD há cinco anos. Tivemos notícia, também, de que, na Costa Rica, recentemente, foi revogado o dispositivo que exigia o pagamento das municipalidades pela execução de obras musicais em seus eventos, o que gerou fortes críticas da Associação de Compositores e Autores Musicais da Costa Rica (ACAM). Como se encontra a situação naquele país? Por outro lado, você tem alguma notícia do Ministério da Cultura brasileiro criticando ou apoiando a inadimplência das inúmeras prefeituras do Brasil? Como você analisa essa questão?

Marcus Vinícius de Andrade: Embora já existam inúmeras decisões judiciais, inclusive de Cortes Superiores, condenando as prefeituras que não pagam ao ECAD e reconhecendo em definitivo a obrigatoriedade da remuneração aos criadores musicais pelos organismos públicos, a prática do calote continua ocorrendo. O que ocorre em Salvador é vergonhoso, não bastasse essa cidade ser uma das vitrines musicais do Brasil, tendo na música e no Carnaval uma de suas principais fontes de receita turística. Tenho certeza de que, mais dia ou menos dia, a Prefeitura de Salvador será condenada a pagar o que deve aos autores, pois tem sido assim em quase 100% dos casos similares.

Com relação à situação da Costa Rica, cabe dizer que a comunidade autoral internacional, via CISAC [Confederação Internacional de Sociedades de Autores e Compositores], está mobilizada no apoio jurídico a ACAM [Associação de Compositores e Autores Musicais da Costa Rica], além de estar socorrendo financeiramente essa sociedade coirmã. As primeiras reações internacionais já fizeram as autoridades costarriquenhas recuar um pouco, reconhecendo que o assunto “deve ser melhor discutido”, o que já prenuncia uma possível mudança de postura. Isso talvez venha a ocorrer com o novo governo. Não sendo assim, as sociedades internacionais dispõem-se até a suspender as licenças para uso de seus repertórios na Costa Rica, além de tomar medidas que reparem os prejuízos havidos durante a vigência do malsinado dispositivo que “liberou” as municipalidades do pagamento das obrigações devidas a terceiros.

No Brasil, não há notícia de que o MinC tenha, em algum momento, apoiado expressamente a inadimplência das Prefeituras e órgãos públicos quanto aos direitos autorais. Mas, por outro lado, também jamais se viu o MinC condenar ou criticar os usuários que afrontam abertamente a lei e deixam de pagar ao ECAD. Isso é muito mais grave, pois mostra a omissão do Estado quanto ao cumprimento das leis e da defesa dos direitos dos cidadãos-criadores. Aliás, pelo que se sabe, jamais o MinC, o Ministério da Justiça ou qualquer outra instância do Governo Federal promulgou qualquer disposição ou norma a respeito do cumprimento da legislação autoral na esfera pública.

Na edição do jornal O Globo de 06 de dezembro de 2007, foi publicado o artigo “Desafinado”, assinado por você, Paulo César Pinheiro e Nei Lopes. Há críticas pesadas ao então Ministro Gilberto Gil. Como você vê, atualmente, o mandato de Gil no MinC? Em relação ao Direito Autoral, quais foram os principais avanços e retrocessos?

Marcus Vinícius de Andrade: Bem, as críticas tiveram tom elegante e elevado, embora fossem contundentes. Para nós, é lamentável ver que o Ministério da Cultura está agindo na área autoral exatamente como os antigos governos militares, ou seja, querendo tutelar as entidades dos criadores, que somente lutam por seus direitos legais, enquanto nada faz para coibir a inadimplência dos usuários e os abusos dos que violam sistematicamente a lei. Para que se tenha uma ideia, hoje cerca de 50% das emissoras de radiodifusão, que são concessões de serviço público, não pagam ao ECAD (diga-se, aos titulares de direitos de autor e conexos). Foi para denunciar essa situação que eu, Paulinho César Pinheiro e Nei Lopes escrevemos o artigo referido. Insurgimo-nos também contra o fato de o MinC, contrariamente ao que apregoa, ter-se fechado ao diálogo permanente com as entidades autorais que compõem a sociedade civil organizada: ao contrário, o MinC sucumbiu ao assembleismo pueril e preferiu discutir os temas culturais e autorais em “plenárias” de qualificação e legitimidade duvidosas, porque quase sempre compostas por claques de palpiteiros e meros curiosos.

Desse debate apressado e - por que não dizer? - leviano, no qual foram ouvidos até usuários inadimplentes e representantes de interesses estrangeiros desejosos de enfraquecer a relevância autoral do Brasil, saíram as novas ideias do MinC sobre Direito de Autor, inclusive o apregoado projeto de lei autoral (que ainda ninguém viu). Os artistas e produtores culturais brasileiros repudiam veementemente essas ideias e projetos, não só por sua gestação canhestra, como também por seu caráter autoritário e nocivo aos interesses culturais nacionais.

Sempre tive grande afeto e respeito por Gilberto Gil, meu amigo há exatos 46 anos, e penso que sua passagem pelo MinC teve a virtude de suscitar o debate sobre a questão autoral, o que foi positivo. Mas, por outro lado, foi extremamente negativo ver o MinC de Gil abraçando ideias de fundo neoliberal, como a flexibilização dos direitos dos cidadãos, a cultura da (falsa) “gratuidade”, a informalidade na produção da cultura, a desmonetização dos bens e serviços culturais, etc., etc. Um país como o Brasil, que é produtor de cultura, que já foi o 6° mercado discográfico do mundo e que tem uma música popular reconhecida e valorizada internacionalmente, não pode dar-se à leviandade de jogar essa riqueza por terra para assumir uma postura coitadinha, despossuída, como se fosse um país de Terceiro Mundo em que a cultura só pode circular se estiver desprovida de valor econômico. Não dá pra aceitar essa cultura de camelô, que flerta com a informalidade, com a pirataria e até com a contravenção, tudo isso sob o pretexto de facilitar o acesso das comunidades ao conhecimento. Nós já somos uma sociedade pós-industrial, além de uma das dez maiores economias do mundo, portanto não podemos continuar vivenciando uma condição periférica que já superamos há muito. Como diz o embaixador Samuel Pinheiro Guimarães, já estivemos na periferia por 500 anos: agora chegou o momento de o Brasil assumir uma condição de maior protagonismo mundial, inclusive na cultura. Mas nós só conseguiremos isso se rompermos esse complexo de vira-lata que nos faz retirar o valor de nossos bens culturais e incentivar a informalidade produtiva, o que inclui relativizar ou até mesmo eliminar o instituto do Direito de Autor, como muitos pregam. Aliás, é exatamente isso o que querem as grandes corporações da indústria cultural, sequiosas de obter “conteúdos” gratuitos para lucrar com eles na Internet. Rejeito a ideia de que o direito autoral é um impedimento para a democratização da cultura e para a maior circulação dos bens culturais. Isso se consegue é com políticas públicas eficientes, não com a limitação (ou mesmo a expropriação) dos direitos de autor e conexos, como parece pensar o MinC desde a época do Gil. Temos de tomar consciência de que a valorização do patrimônio cultural nacional passa necessariamente pela proteção dos direitos autorais e pelo reconhecimento da cultura como um ativo econômico relevante e estratégico para o país. Infelizmente, a política do MinC optou pelo entendimento contrário, passando a incentivar e a glamurizar a cultura intelectual e economicamente pauperizada “dos campinhos de várzea” e das periferias, criando um simulacro de processo cultural que eu chamo de “inclusão para fora”, já que condena artistas e produtores a ficarem conformadamente fora do mercado, restritos ao espaço dos guetos. Embora aparentemente democrático, esse modelo cultural mantém os pobres e excluídos em seu lugar, enquanto as grandes corporações ficam livres para monopolizar, com todos os meios de que dispõem, os espaços reais e virtuais do mainstream cultural. Acho que esse é o principal retrocesso da política cultural lúmpen adotada pelo MinC. Mas há outros, também...

Como você vê a questão das trocas de arquivos peer-to-peer? O adolescente brasileiro, hoje, faz com grande naturalidade o download de músicas protegidas. Essa prática consiste numa das maiores preocupações dos autores e das editoras e gravadoras. Como você enxerga essa questão, sob o ponto de vista sociológico e jurídico? Como diretor artístico do selo CPC-UMES, acredita que essa tendência é irreversível?

Marcus Vinícius: Em novembro último, participei em Madri do seminário “Música & Futuro”, em que estiveram presentes todos os setores envolvidos na criação/produção/difusão de música digital, inclusive gigantes como Microsoft, Apple, Google, YouTube, etc., além de entidades de criadores de quase todo o mundo. Dos debates ali havidos ficaram algumas conclusões:

1) Já existem mecanismos para monitorar e regular o compartilhamento de arquivos na Internet, com o consequente controle dos direitos autorais das obras utilizadas; entre tais mecanismos, podemos citar a plataforma técnica DDEX (Digital Data Exchange), que está definindo os modelos para a gestão das trocas digitais nas redes eletrônicas; e, no âmbito jurídico, a lei HADOPI da França, que cria um grupo especial de juízes para analisar e estabelecer penalidades para os abusos no compartilhamento de arquivos.

2) Tudo faz crer que os tempos da Internet “gratuita” logo chegarão ao fim, pois estão sendo criadas formas de remuneração para as obras intelectuais que transitam na rede. Aliás, cabe lembrar que os usuários de Internet já pagam pelos serviços que recebem, pagando também, indiretamente, pelo volume de publicidade (spams, etc.) que chegam nos milhões de sites e páginas eletrônicas existentes. Isso mostra que a Internet é um espaço capitalista, não uma casa de caridade. Há muito dinheiro para remunerar os criadores e as projeções indicam que as novas formas de arrecadação de direitos autorais na rede podem ser muitas vezes superiores ao que se arrecada convencionalmente.

3) O compartilhamento peer-to-peer é uma realidade e ninguém pode contestar que, como fenômeno sociológico, tornou-se uma prática regularmente aceita. Não se pode, no entanto, criminalizar o adolescente a que você se refere, que faz downloads de obras protegidas com naturalidade; a tendência mundial, por tudo que falei acima, é que os provedores de sinais e conteúdos, além dos anunciantes, sejam corresponsáveis pelo material que disponibilizam, inclusive no que se refere às licenças para uso de obras intelectuais. E sejam também os pagadores dos direitos respectivos. Não é o usuário final que deve fazer isso. 

E o Rodrigo Rod também contribui com o debate:

Nossa!! Já criaram uma novela inteira por conta dessa bobajada de CC. Cheia de fontes internas secretas, provavelmente grampos sem áudio, etc. Nomeações garantidas e outras novelices.
Já, já aparece um Quícoli dizendo que a ministra comprou um CD pirata. E esse CD foi comprado para presentear a presidenta e ela aceitou, impeachment já, etc...

Pelo visto nossa soberania fica abaixo dos interesses da Creative Commons que quer forçar a barra em cima desse negócio que ela mesmo inventou para um dia ser vendida por 1 bilhão de dólares.

Pelo visto, também, o PIG já definiu seu primeiro alvo de linchamento e difamação.

Já que não conseguem atingir a Dilma, muito menos o Lula, resolveram atacar pelos flancos, minando as áreas de apoio do Governo, como Cultura e Educação. O próximo é Saúde, pode apostar.

Agora a pergunta que não quer calar: O que produz o site do MinC de tão interessante a ponto das pessoas considerarem-lo fonte de criação, impondo o uso da licença?

Esperemos a ministra fazer uma bobagem de verdade, não esse factóide, para que baixemos o sarrafo. Por enquanto a cena é so do PIG e correligionários.

Enquanto isso a equipe do MinC ficou assim:

Ministra da Cultura anuncia equipe
Brasília, 21 de janeiro de 2011 – A ministra da Cultura, Ana de Hollanda, define a equipe com que vai implementar as políticas culturais do governo da presidenta Dilma Rousseff. São duas as mudanças estruturais. Uma é a criação de uma Secretaria da Economia Criativa. “Não é possível ignorar, neste início do século XXI, a importância da economia da cultura para a construção de uma nação desenvolvida. Por isso, decidimos criar uma estrutura que possa pensar todas as potencialidades desta área no Brasil”, afirma a ministra.


A segunda alteração é a unificação das atuais Secretaria de Cidadania Cultural e Secretaria da Identidade e Diversidade na nova Secretaria da Cidadania e da Diversidade Cultural. “A nova secretaria terá áreas específicas para cuidar de cada tema, mas ganhará em eficiência por meio da integração das políticas voltadas ao cidadão, que antes eram executadas em secretarias diferentes”, explica a ministra.

A seguir, os nomes escolhidos pela ministra:

Secretário-executivo: Vitor Ortiz, secretário da Cultura das cidades gaúchas de Viamão (1997/2000), Porto Alegre (2002/2004) e São Leopoldo (2009/2010). Foi diretor da Funarte e diretor de relações institucionais da Bienal de Artes Visuais do MERCOSUL e gerente da Gerência Regional da Empresa Brasil de Comunicação (EBC) no Rio de Janeiro.

Secretário de Articulação Institucional: Roberto Peixe, designer, arquiteto e gestor cultural, foi secretário de Cultura de Recife de 2001 a 2008. Antes, havia sido Secretário do Patrimônio Cultural e Turismo da cidade de Olinda, em 1995. A partir de 2009, assumiu o cargo de Coordenador Geral de Relações Federativas e Sociedade da Secretaria de Articulação Institucional do Ministério da Cultura, e passou a coordenar a elaboração e implantação do Sistema Nacional de Cultura (SNC).

Secretária do Audiovisual: Ana Paula Santana, advogada, especialista em relações internacionais e gestão do entretenimento. Entrou na SAV em 2002 como estagiária. Depois, foi para a coordenação internacional da SAV e para a área de fomento a programas e projetos audiovisuais. Foi chefe de gabinete e, depois, Diretora de Programas e Projetos Audiovisuais, cargo que ocupava até agora.

Secretária da Cidadania e da Diversidade Cultural: Marta Porto, mestre em Ciências da Informação pela UFMG, especialista em políticas de comunicação, cultura e investimento social privado. Consultora de entidades e organizações multilaterais como a UNICEF. Foi Diretora de Planejamento e Coordenação Cultural da Secretaria Municipal de Cultura de Belo Horizonte (1994/96) e Coordenadora Regional do Escritório da UNESCO do Rio de Janeiro (1999/ 2003).

Secretária da Economia Criativa: Cláudia Leitão, Doutora em Sociologia pela Université de Paris V, é professora do Programa de Pós-Graduação em Políticas Públicas e Sociedade da Universidade Estadual do Ceará (UECE), onde lidera o Grupo de Pesquisa sobre Políticas Públicas e Indústrias Criativas. Foi Secretária da Cultura do Estado do Ceará no período de 2003 a 2006.

Secretário de Fomento e Incentivo à Cultura: Henilton Menezes, produtor cultural e consultor para elaboração de projetos. Foi gerente da área de cultura do Banco do Nordeste, sendo responsável pela criação e desenvolvimento do Programa BNB de Cultura, edital de patrocínios culturais e pela instalação da rede de centros culturais da estatal. É secretário de Fomento e Incentivo à Cultura desde o início de 2010.

Secretário de Políticas Culturais: Sérgio Mamberti, ator e dramaturgo, foi secretário de Artes Cênicas; de Música; e de Identidade e Diversidade Cultural do Ministério da Cultura. Em 2008, assumiu a presidência da Fundação Nacional das Artes (Funarte).

Diretor-geral da Agência Nacional de Cinema: Manoel Rangel, neste mesmo cargo desde dezembro de 2006, é cineasta, formado pela Universidade de São Paulo (1999). Foi presidente da Comissão Estadual de Cinema da Secretaria de Estado da Cultura de São Paulo (2001/2002) e assessor especial do ministro Gilberto Gil (2004/2005), quando coordenou o grupo de trabalho sobre regulação e reorganização institucional da atividade cinematográfica e audiovisual no Brasil.

Presidente da Fundação Biblioteca Nacional: Galeno Amorim, jornalista e escritor, foi secretário de Cultura de Ribeirão Preto na gestão do então prefeito Antonio Pallocci. Presidiu o Comitê Executivo do Centro Regional de Fomento ao Livro na América Latina e no Caribe e participou da criação do Plano Nacional do Livro e Leitura. É diretor do Observatório do Livro e da Leitura e consultor internacional de políticas na área.

Presidente da Fundação Casa de Rui Barbosa: Emir Sader, formado em filosofia pela Universidade de São Paulo (USP). Aposentou-se como professor de sociologia. Passou a ser professor da UERJ, onde trabalha, nos cursos de Políticas Públicas e História. Autor, entre outros, de “A nova toupeira”, e organizador de “Latinoamericana – Enciclopédia Contemporânea da América Latina e do Caribe”, ganhador do Prêmio Jabuti como o melhor de não-ficção do ano.

Presidente da Fundação Cultural Palmares: Eloi Ferreira, ex-ministro da Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial (Seppir) em 2010. Antes, havia ocupado a secretaria-adjunta da Seppir e coordenado a equipe organizadora da 2ª Conferência Nacional de Promoção da Igualdade Racial.

Presidente da Fundação Nacional das Artes: Antonio Grassi, ator, diretor e produtor, cursou Ciências Sociais na UFMG. Foi secretário de Cultura do Estado do Rio de Janeiro, além de presidente da Fundação Theatro Municipal do Rio de Janeiro e presidente da Funarte. Atuou como assessor especial do Governo do Estado de Minas Gerais. Ocupava, até agora, o cargo de gerente executivo regional da TV Brasil no Rio de Janeiro.

Presidente do Instituto Brasileiro de Museus: José do Nascimento Jr, formado em Ciências Sociais pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Foi diretor do Departamento de Museus e Centros Culturais do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (DEMU/Iphan). Preside o Ibram desde a criação da autarquia, em janeiro de 2009.

Presidente do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional: Luiz Fernando de Almeida, arquiteto. Lecionou na área durante 16 anos. Atuou em projetos de Desenvolvimento Urbano e de Habitação na Companhia Metropolitana de Habitação, na Empresa Municipal de Urbanização e na Câmara Municipal de São Paulo. É presidente do Iphan desde 2006.


sexta-feira, 14 de janeiro de 2011

Artigo - A Cultura Como Inclusão Social

Belo artigo que procura ampliar os conceitos de cultura e suas políticas em uma sociedade. Apesar de fazer um comentário do Brasil como um todo, seria muito produtivo reduzir sua dimensão para nossa terrinha...

Do Luis Nassif

De CartaCapital
Cultura e democracia


Por Aluizio Belisário*

No momento em que são apresentados novos ministros – responsáveis pela definição e condução das políticas públicas setoriais a serem implementadas no país – parece interessante promover uma reflexão mais cuidadosa sobre a área da cultura, de importância fundamental em um processo voltado para a construção de uma sociedade mais justa para todos os seus membros.

Diversos aspectos ligados à cultura contribuem sobremaneira para a reprodução de uma sociedade dividida pela tecnologia, podendo se dizer que são ao mesmo tempo sua causa e consequência, pois se não podemos afirmar a existência de revoluções tecnológicas sem transformações culturais, também não podemos negar o papel da tecnologia na conformação cultural da sociedade.

É possível afirmarmos que as sociedades criam um imaginário através do qual se reproduzem, identificando o grupo social, distribuindo identidades e papéis, expressando os desejos e objetivos coletivos, de modo que todas elas se auto referenciam a partir de suas normas e valores fixados simbolicamente, como diz Pierre Ansart (Ideologias, conflitos e poder. Zahar, Rio, 1978).

Segundo o PNUD/Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento, cultura não pode ser considerada como um conjunto cristalizado de valores e práticas, por recriar-se permanentemente à medida que as “pessoas questionam, adaptam e redefinem os seus valores e práticas em função da mudança das realidades e da troca de ideias”.

De qualquer modo, é possível pensar-se em cultura como um conjunto de aspectos, processos, rituais, hábitos, crenças e valores que garantem o reconhecimento de uma identidade a um determinado grupo social. Infelizmente, entretanto, a cultura é quase sempre vista como propriedade dos grupos hegemônicos, que buscam a desqualificação dos setores dominados, classificando suas manifestações culturais como folclóricas, atribuindo-lhes assim, um cunho depreciativo.

Ainda segundo o PNUD é possível identificar-se duas formas de exclusão social: a do modo de vida, que nega o reconhecimento e aceitação de um estilo de vida de um grupo, ao insistir em que cada um viva como toda a sociedade e; a da participação, quando a discriminação das pessoas as coloca em desvantagem nas oportunidades sociais, políticas e econômicas em função de sua identidade cultural.

Assim, considerando a cultura como um dos elementos fundamentais, no processo de dominação e entendendo ainda que as ações do aparelho cultural, embora cumpram o papel de garantir a manutenção e reprodução da ideologia dominante e, consequentemente, da estrutura socioeconômica dominante, também podem levar ao questionamento desta estrutura de dominação, sendo evidente a necessidade de se atuar neste campo, em busca da superação das situações de dominação vigentes.

Tais observações nos levam a afirmar a necessidade de se garantir o acesso dos setores dominados ao seio da cultura da sociedade, como uma das formas de superação da situação de dominação existente, num processo que pode ser denominado de “alargamento cultural”, no qual é absolutamente necessário que os aspectos, processos, crenças, etc. destes grupos também sejam levados aos grupos hegemônicos – ou seja, o processo de alargamento cultural deve ocorrer em via de mão dupla.

O exemplo das universidades que vem utilizando o sistema de cotas de acesso para negros, que passaram a sofrer uma explicável e justa pressão para incorporarem em seus currículos conteúdos sobre a história da África e da participação dos negros no desenvolvimento da cultura do país é um forte indicativo da importância deste duplo sentido do processo de alargamento cultural.

Gramsci utiliza o conceito de hegemonia para explicar o controle do Estado burguês sobre ideias e instituições no exercício da dominação política, observando que o controle que as classes dominantes exercem sobre a classe dominada, no campo da cultura, reduz a necessidade de uso da força física, o que nos leva à afirmação de que os fatores ligados diretamente ao processo produtivo não são os únicos responsáveis pelo exercício do poder, daí a importância de se travar uma forte luta pela superação de uma situação de dominação, ao nível das ideias e das formações culturais.

É possível afirmarmos que este início de século vem se caracterizando pela ocorrência de grandes transformações de cunho econômico e social, que acenam com uma possibilidade concreta de superação do quadro de forte exclusão social, gerado por uma sociedade caracterizada por uma cultura em que as tecnologias de informação e comunicação cumprem um papel de divisoras sociais e não de integradoras.

Ao observar o mundo através de sua cultura o homem tende a considerar o seu modo de vida como o mais correto e natural. Esta tendência ao etnocentrismo pode ser responsável pela ocorrência de inúmeros conflitos sociais ao promover a discriminação dos que são diferentes, pertencem a outro grupo, etc., levando a que suas práticas culturais sejam tratadas de modo depreciativo.

Pensar em uma sociedade mais justa implica em trilhar um caminho que conduza à modernização, com base em um sistema produtivo que não se caracterize pela acumulação selvagem de capital, resultante de um processo violento de espoliação de valor do trabalho e, consequentemente, de desprezo pelo homem, mas sim, baseado em um sistema produtivo que não apenas respeite o homem como elemento fundamental desse sistema, mas principalmente, que o trate como o objetivo central do processo.

Para tal, é necessário construir uma sociedade cujo fundamento ético seja o respeito à dignidade humana, o que implica, obviamente, na adoção de políticas de distribuição de riquezas coerente com o desenvolvimento produtivo, as quais permitam à sociedade como um todo, e não apenas a uma reduzida parte desta, se beneficiar do esforço coletivo.

Falar em distribuição de riquezas evoca, inicialmente, a ideia de melhor remuneração do trabalho, distribuição de lucros e outros mecanismos econômico-financeiros. Entretanto, tais mecanismos podem ser considerados voláteis, à medida que podem se desvanecer com o tempo, enquanto que outras formas de distribuição, que se processem através da educação e da cultura tendem a ser permanentes em seus efeitos.

Daí a importância do desenvolvimento de um processo de “alargamento cultural”, no qual se destaca a necessidade de se criarem meios de acesso dos grupos oprimidos à cultura do grupo hegemônico e vice-versa, possibilitando aos primeiros, a partir do conhecimento desta cultura dominante e das interferências provocadas nesta, pela inserção de sua própria cultura, a realização de transformações sociais necessárias ao rompimento da dominação política, econômica, social e cultural.

Como, entretanto, em qualquer sociedade não é possível que um indivíduo ou grupo domine todos os aspectos de sua cultura, a participação dos diversos grupos componentes da sociedade, nas definições sobre política ou políticas culturais a serem implementadas no país, torna-se imprescindível, não apenas como garantia da real ocorrência de um alargamento cultural, mas como base de sua própria articulação com os demais membros da sociedade, o que implica na necessidade de democratização radical das ações do Ministério da Cultura, através da convocação dos diversos grupos para a discussão e decisão a respeito das políticas a serem implementadas.

*Aluizio Belisário é Professor Adjunto da UERJ. Doutor em Educação-PROPED/UERJ, Mestre e Bacharel em Administração Pública-EBAPE/FGV.

http://www.cartacapital.com.br/politica/cultura-e-democracia